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O Rio do morro ao mar

A administração Carlos Sampaio

A administração do engenheiro Carlos Sampaio foi marcada por grandes obras e polêmicas. Em 1920, o novo prefeito do Distrito Federal, indicado pelo presidente Epitácio Pessoa, assume com o compromisso de executar grandes transformações na cidade, para promover e melhorar a urbanização, o saneamento e a higienização de diversas áreas bastante comprometidas, bem como realizar obras de embelezamento, de modernização e, no dizer da época, de "civilização". Com a proximidade da visita do casal real da Bélgica naquele mesmo ano e das comemorações do centenário da Independência em 1922, o prefeito deu início a um programa de intervenções em diversas localidades da cidade, mais enérgicas na região central, em especial na área do morro do Castelo e do bairro da Misericórdia, que foram, sob suas ordens e comando, praticamente varridos do mapa.

Carlos Sampaio tornou-se uma figura célebre na história do Rio de Janeiro por ter sido o responsável pelo arrasamento do morro do Castelo, concretizando um projeto bastante antigo, mas que tomara força a partir das últimas décadas do século XIX, embasado no argumento sanitarista e da medicina social, em voga na época. A derrubada começou a ser seriamente considerada a partir de 1798, quando foi feito o primeiro inquérito pela Câmara junto aos médicos do reino e da colônia sobre a necessidade de arrasamento do morro para a melhoria da circulação dos ventos e da salubridade da cidade, evitando-se, assim, a propagação de epidemias. Na maior parte do tempo, prevaleceu a visão de que o morro não teria efeitos assim tão perniciosos, mas à medida que a cidade descia em direção à várzea e avançava para o interior, o Castelo aparecia como um entrave à entrada dos ventos do mar na cidade e como um símbolo de antiguidade e atraso.

Quando o prefeito decide botá-lo abaixo, alegando a necessidade de remover a barreira natural e sanear a região da Misericórdia, um dos argumentos que usou a seu favor foi a própria história do Rio de Janeiro. A cidade fora, desde o início, construída a partir de drásticas interferências dos homens na natureza e no espaço físico, bastando lembrar os aterramentos das lagoas, dos pântanos, a derrubada de outros morros menores e aterros na baía da Guanabara. Não é demais ressaltar que, com o arrasamento do morro, um novo bairro surgiria em local privilegiado, permitindo o crescimento do centro do Rio e a geração de renda para os cofres da prefeitura, que ficaria encarregada de vender os lotes e cobrar os devidos impostos aos novos proprietários. O próprio Carlos Sampaio era sócio de uma das firmas que se encarregou dos trabalhos de demolição no início das obras.

Além do morro, o plano de urbanização do centro previa o remodelamento do bairro da Misericórdia, que ocupava a região que vai do antigo largo do Paço em direção à ponta do Calabouço e era delimitado, por um lado pela própria baía da Guanabara, e pelo outro pelo morro do Castelo. A reputação de bairro miserável, perigoso, habitado e frequentado por pobres, marinheiros, mestiços e estrangeiros (sobretudo chineses, conhecidos como fornecedores e consumidores de ópio) - uma população à margem da boa sociedade carioca - justificava, na visão dos governantes, uma ação para não comprometer os novos terrenos que surgiriam com as obras do Castelo. Pouco importava que muitos entre os habitantes daquele labirinto de ruas estreitas e casas baixas fossem trabalhadores, que a região não recebesse qualquer atenção do poder público e por isso estivesse em tão mau estado de conservação. O novo bairro e os novos terrenos que surgiriam com o aterro que seria feito com a terra do Castelo da ponta do Calabouço à praia do Russel serviriam para abrigar a Exposição Internacional do Centenário. Vinha abaixo o morro, e com ele o passado da cidade, para garantir a construção do novo futuro, de progresso e modernidade.

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