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Golpe militar

Escrito por Cláudia Heynemann

Um verão "bissexto, ameno e calmo" se encerrou na Guanabara, em 22 de março de 1964, segundo a edição do Correio da Manhã. Naqueles quase três meses sucederam-se os acontecimentos em sequência ritmada pelas manchetes de jornais, seguindo a lógica de um acirramento, dos discursos inflamados, das marchas da família organizadas pela direita, das greves, das reformas propostas pelo governo e exigidas nas ruas, dos acordos políticos declarados ou não.

Após a ruptura da ordem constitucional, as interpretações disputam um lugar. Do lado inicialmente vitorioso, a "revolução" vinha para garantir a ordem democrática: essa era a natureza do "movimento civil e militar" como dispôs o Ato Institucional n. 1 (AI-1). De outro, o desfecho de 64 foi atribuído por alguns ao conflito entre modelos de desenvolvimento, que opunham dependência externa e concentração de renda à opção nacionalista e distributiva, entre outros fatores estruturais. Também se compreendeu a deposição de Goulart como decorrente das crises na economia e no sistema partidário, além da reação à crescente participação dos movimentos populares na vida política, dando um caráter "preventivo" à ação militar. Outra versão bastante aceita e difundida aposta na conspiração de setores conservadores da sociedade brasileira, representados pela Escola Superior de Guerra, por instituições como Ipes, Ibad, Camde, pela grande imprensa, aliados dos interesses do capital internacional, e mais especificamente, sublinha-se a decisiva participação do Departamento de Estado norte-americano e da CIA. Em estudos mais recentes considera-se que o evidente apoio dos EUA à deposição de Goulart, não deve, contudo, obscurecer o protagonismo e o grau de autonomia dos que, no Brasil, conduziram o movimento de março de 1964.

Um processo cujo princípio pode ser datado ainda em 1961, com a tentativa dos ministros militares de impedir a posse de Jango e com os anos da mais intensa mobilização popular até então assistida. Inevitável ou contornável, a crise institucional se instala e setores de composição heterogênea se unificam de um lado, pela urgência e aprofundamento das reformas e de outro, pelo temor de setores de elite, embalado no pacote do caos, da desordem, do avanço do comunismo sustentado por Moscou, ao estilo cubano. A disposição cronológica das imagens desse módulo coincide com a narrativa dos eventos que aqui revisitamos: a regulamentação da Lei de Remessas de Lucros, o relacionamento com as Forças Armadas, o comício da Central, personagens como Lacerda e Magalhães Pinto, o embaixador Lincoln Gordon, o "cabo" Anselmo. E os primeiros dias de abril, carros revistados, tropas nas ruas. Um pouco antes, o Carnaval, e ao longo do ano, o futebol, e os movimentos artísticos de vanguarda, a glória dos anos 1960: o filme Deus e o Diabo na Terra do Sol e o espetáculo Opinião. O embarque para o exílio do deputado Rubens Paiva, em junho, dava a medida do que se seguiria como escreveu o poeta Ferreira Gullar, ex-presidente do Centro Popular de Cultura - CPC da UNE, no livro Antes do golpe: notas sobre o processo que culminou no golpe militar de 1964: "naquele dia, a junta militar que assumiu o governo exigiu do Congresso a cassação do mandato do presidente da República, o que foi prontamente aprovado (...). Iniciava-se assim, no Brasil, um regime autoritário que duraria 21 anos".

 

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